DE EXPERIÊNCIA A POLÍTICA PÚBLICA
No ano de 2000, havia um sonho, uma causa: levar a
justiça mais próxima à comunidade. Uma juíza, alguns abnegados, um ônibus para
atender às comunidades do Distrito Federal com dificuldades de acesso à
Justiça. Era uma equipe pequena, mas absolutamente convencida de que uma
parcela majoritária da população não tem condições de submeter suas demandas à
Justiça formal, seja por razões de ordem formal ou simbólica. Já tinham a clareza
de que, além de inacessível financeiramente para alguns, a Justiça veicula
excessivo formalismo em sua liturgia forense.
Não sonhavam que aquela iniciativa, à época ainda
em construção, de buscar a implementação de um mecanismo alternativo e democrático
de acesso à Justiça, fosse um dia se transformar em política pública, com
possibilidade de replicação em todas as regiões do país. Tinham e defendiam um objetivo:
democratizar a realização
da Justiça, restituindo
aos cidadãos e
à comunidade a capacidade de gerir seus próprios conflitos
com autonomia.
Rapidamente, o projeto, com o apoio do Tribunal deJustiça do Distrito Federal, do Ministério da
Justiça, do PNUD,
entre outros, foi
se consolidando. O
programa foi denominado
“Justiça Comunitária” e constituído dois núcleos em cidades satélites de
Brasília (Taguatinga e Ceilândia).
De pronto, a iniciativa chamou a atenção da
comunidade jurídica e, mesmo de forma não orgânica, começou a ser replicada em
alguns municípios da federação. O
prestigiamento de procedimentos
alternativos ao processo
judicial clássico, baseados fundamentalmente na mediação e
composição de conflitos, que recebe a recomendação da ONU, constitui um
importante caminho para soluções pacíficas dos conflitos vivenciados pelos
cidadãos e de fortalecimento da coesão social. O acesso à Justiça é considerado
um direito fundamental e um caminho para a redução da pobreza, por meio da
promoção da equidade econômica e social.
Onde não há amplo acesso a uma Justiça efetiva e de
qualidade, a democracia está em risco e o desenvolvimento harmônico não é
possível.
De ressaltar-se que o investimento em sistemas
alternativos de solução de conflitos é interessante, não como substituto do
direito fundamental de acesso ao Poder Judiciário, mas como mecanismo
complementar que pode ajudar a, cada vez mais, produzir espaços em que a gestão
social de interesses antagônicos seja operada dentro das regras do Estado de
Direito e com respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos.
É
evidente que o
formato centrado de
solução de litígios
no modelo concentrado
do estado-juiz, tanto no Brasil como no mundo, revela-se esgotado. O
elevado índice de litigância verificado em nosso sistema não traduz a
universalização dos meios e instrumentos de acesso à Justiça no Brasil. Ao
contrário, os dados disponíveis indicam uso excessivo da máquina do Judiciário
por grandes corporações e pela Administração Pública em todos os seus níveis,
ao passo que as demandas da população
economicamente necessitada não chegam, de regra, às instâncias formais
da Justiça. De outra banda, a Justiça não será fortalecida apenas com reformas
que visem a combater a morosidade do Poder Judiciário, mas, fundamentalmente,
pela universalização do acesso, conhecimento de
direitos e proximidade do sistema de justiça junto ao cidadão.
A Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério
da Justiça definiu como prioridade para a atual gestão o tema Democratização do
acesso à Justiça, ao lado da continuidade das reformas constitucionais e
infraconstitucionais
voltadas à modernização
e racionalidade da prestação jurisdicional.
Esta decisão exige a continuidade de ações voltadas
ao fortalecimento das defensorias públicas
para que a
população mais necessitada
seja plenamente incluída
no sistema jurisdicional de
prestação da Justiça, por meio de atendimento eficiente e de qualidade voltado a
concretizar o preceito constitucional de acesso à Justiça pela ampliação da
assistência jurídica gratuita. Exige, também, a própria democratização da
Justiça, definida quando efetivamente operada na comunidade, para a comunidade
e, sobretudo, pela comunidade, como é o caso da Justiça comunitária.
Por
isso que a
Secretaria de Reforma
do Judiciário propôs
a transformação da experiência de
Justiça Comunitária, de
Brasília, com os
aperfeiçoamentos
incorporados e outras iniciativas similares, em uma política
pública com investimento permanente, a fim de apoiar financeiramente e
incentivar institucionalmente projetos de implantação de núcleos de mediação
comunitária em todas as regiões do País.
A
expectativa é a
disseminação de núcleos
da Justiça Comunitária como
forma de fortalecer a
cidadania pela informação
e conscientização em
direitos e preparação
de lideranças comunitárias para atuarem como mediadores de conflitos em
suas comunidades. Após a difusão
desse projeto, em
parcerias com órgãos
estatais, em especial
da Justiça, e entidades da sociedade civil, esperamos
consolidar essa experiência como um efetivo meio de
resolução de conflitos,
combinando prevenção, diminuição
da judicialização e
obtenção de maior pacificação
social. Com isso,
poderemos passar para
a fase de
massificação do projeto.
A ação, incluída que está no Programa Nacional de
Segurança com Cidadania - PRONASCI, desenvolvida por meio da atuação voluntária
de agentes comunitários e com auxílio de equipes interdisciplinares, deixou, no
início do ano de 2008, seu estágio de “experiência,” para tornar-se uma
“política pública”, com apoio técnico e suporte de recursos orçamentários do
Ministério da Justiça, já destacados no Plano Plurianual, até 2011.
Vários
núcleos de Justiça
Comunitária estão sendo
implantados ou fortalecidos
por todas as regiões do país, objetivando a coesão social, a
solidariedade, a promoção da paz, por meio de atividades de informação jurídica,
mediação comunitária e animação de redes sociais.
Espera-se, assim, contribuir, de forma decisiva,
para a inclusão de milhões de brasileiros que ainda se encontram à margem do
sistema de Justiça. Nesse sentido, esta
publicação atualizada servirá
como orientação e
guia teórico para os
parceiros do projeto,
em especial os
capacitadores e agentes
da comunidade que
serão habilitados
tecnicamente para a
mediação comunitária. Ao
mesmo tempo, serão
editados materiais complementares para servirem de manuais práticos na
implementação do projeto, conferindo apoio técnico e unicidade na efetivação
dessa política pública de democratização da Justiça.
Cabe destacar que a mediação comunitária é uma
importante ferramenta para a promoção do empoderamento e da emancipação social.
Por meio dessa técnica, as partes envolvidas no conflito têm a oportunidade de
refletir sobre o contexto de seus problemas, de compreender os diferentes
perspectivas e, ainda, de construir em comunhão uma solução que possa garantir,
para o futuro, a pacificação social.
Com
esta divulgação, esperamos
melhor difundir o
projeto e despertar
o interesse de parceiros
para a sua
execução, uma vez
que o sucesso
está associado à
cooperação e convergência de
esforços na busca da coesão social pela diminuição da conflituosidade e da violência.
Rogerio Favreto
Secretário de Reforma do Judiciário
Veja na íntegra:
Vídeos interessantes:
JUSTIÇA COMUNITÁRIA